9.1.12

essa porta estreita desfia os fios da minha roupa, desfaz os nos da mais hábil costura. toda a fantasia milimetricamente ajustada para mim é arrancada, esfolando minha pele. eu seguro os farrapos, tento me cobrir, cato-os do chão, mas as paredes arranham meus quadris e ombros. minha carne viva arde, e eu posso sentir a superfície áspera das paredes, embora não consiga vê-las. elas me decompõe, não há pensamento que resista essa dor. começo a correr, porque a sensação da carne se desmanchando, impregnando as paredes de sangue, traz um frescor, uma paz, como se todo sofrimento do mundo acabasse, a liberdade dos loucos.  me despeço do meu rosto, dos músculos torneados, das veias rotas, deixando de existir. não há mais bons modos, sorrisos ou sarcasmo. não há mais status, dinheiro ou empatia. meus desejos foram arrancados com pedaços de pele. todas as fantasias se foram. não ouço, não vejo, sinto tudo como pela primeira e ultima vez.  só resta alma. só resta quem sou.

Mas a Porta da Vida é pequena e a estrada é estreita, e só uns poucos a encontram